Estilo Possível #17: Quem influencia quem na moda?
Será que ainda existe moda como expressão artística?
"Colocado na encruzilhada entre as solicitações do público e o impulso artístico, o criador de modas, mais do que qualquer outro criador, terá, não há dúvida, de alertar sua sensibilidade para o momento social e pressentir os esgotamentos estéticos em vias de se processar."
Gilda de Mello e Sousa
Setembro é sempre um mês cheio de expectativas no mundo da moda. As revistas lançam a maior edição do ano, os desfiles revelam as tendências de verão, as celebridades enchem as filas A. Especialmente esse ano, ainda teve todo o burburinho em torno do novo diretor criativo da Gucci e do último desfile da Sarah Burton.
Nessa semana, com a maratona de semanas de moda finalizada, comecei a analisar as coleções, ler alguns artigos e listar os principais acontecimentos do último mês. Entre algumas coisas lindas e especiais, que talvez mereçam até o polêmico status de objeto de arte, a grande maioria dos itens era extremamente comercial. Comercial no sentido de seguro, sem muita inovação e baseado no que já vem dando certo.
Então, fiquei pensando numa coisa que acho que muita gente pensa quando vê uma peça de roupa recém lançada: por que a moda se desenvolve como se desenvolve? Ou melhor, como uma determinada moda se difunde entre as pessoas?
É claro que as marcas precisam vender, mas o que mais entra nessa conta?
Em uma entrevista recente, o diretor criativo da Balenciaga, Demna, fez a seguinte afirmação: "eu não ligo para o luxo. Eu não quero dar às pessoas uma proposição que as faça parecer ricas ou poderosas. Minha moda funciona de baixo para cima e não de cima para baixo, o que acho que é uma situação muito relacionada a um mundo antigo."
É curioso ele dizer isso porque vai contra uma das principais teorias que analisa a difusão de moda, conhecida como "teoria do gotejamento". Em resumo, ela diz que historicamente as pessoas desejam consumir itens simbolicamente poderosos, que emulem riqueza ou que estejam vinculados a uma classe social mais alta.
Essa teoria vem lá do século 18, quando alguns autores começaram a apontar que a população em geral se dispunha a "admirar, e consequentemente imitar, os ricos e notáveis" (Adam Smith). Surgiram muitas análises apontando o que era percebido como uma tendência à imitação, que fazia com que as "categorias inferiores" usassem o que havia sido rejeitado pelos da corte. E assim, esse passou a ser uma espécie modelo básico das teorias de difusão de moda: os ricos usavam e os outros seguiam.
Depois outros autores começaram a perceber que a sociedade moderna tinha uma flexibilidade maior e que nela as classes mais altas também podiam imitar as inferiores. No livro Moda: uma filosofia, Lars Svendsen cita o exemplo do terno masculino como um traje que migrou da classe média para as classes mais altas nessa época. E, o curioso, é que agora, com os bilionários da tecnologia usando seus moletons e camisetas brancas caríssimos, um terno não é necessariamente um look relacionado a gente rica.
Na última semana de moda de Paris, por exemplo, termos como simplicidade e minimalismo reinaram. Todo mundo lançou sua própria versão do famigerado quiet luxury e isso tornou tudo um bem tedioso.
Vendo alguns desses desfiles, apesar me identificar 100% com esse estilo de visual e de entender que a são peças de vestuário extremamente bem feitas e de qualidade, fico com a pergunta: será ideia que a moda como arte acabou e tudo tá virando só um desperdício organizado?
O que vocês acham?