No próximo 01 de maio acontece o Met Gala que foi muito bem definido por André Leon Talley como o Superbowl da moda. O evento, que anualmente é celebrado, sempre na primeira segunda-feira de maio, marca a abertura da exposição do Costume Institut, do Metropolitan Museum de Arte de Nova York (pra saber a história do MET Gala, escute esse episódio do Estilo Possível sobre o assunto).
Esse ano o tema da exposição é Karl Lagerfeld: A Line of Beauty, em homenagem ao estilista que faleceu em 2019 e foi diretor criativo da Chanel, fotógrafo e acumulou inúmeras outras funções.
Durante seis décadas, Lagerfeld criou não só para a Chanel, mas para Chloé, Fendi, Patou e, claro, para sua própria marca. E peças de todas essas marcas vão ser exibidas na exposição que tem curadoria de Andrew Bolton.
O nome da exposição vem do livro Analysis of Beauty, de 1753, escrito por William Hogarth, um grande tratado sobre beleza, estilo e bom gosto. Em uma entrevista recente, o curador contou que, decidiu focar no legado profissional e no processo criativo de Lagerfeld - e não em sua vida pessoal - e também em trabalhar com linhas de estilo, sem expor os trabalhos em ordem cronológica.
Para Bolton, o maior legado do designer é ter sido o responsável por criar o modelo de diretor criativo/empresário que a gente vê hoje em dia nas grandes casas de moda. Muito antes de Kanye West, Virgil Abloh, Nigo e Jerry Lorenzo, Lagerfeld era alguém que não restringia sua criatividade a um único segmento, então escrevia livros, fotografava as campanhas da Chanel, criava coleções de itens para casa e figurinos para teatro.
Ele também foi o responsável por carregar a Chanel no colo até século 21. Antes dele chegar, a marca tinha apenas uma loja e as vendas de perfumes eram o que pagava 90% da operação. Nos mais de 30 anos em que esteve a frente da marca, Lagerfeld transformou essa situação de quase falência em um negócio de 10 bilhões de dólares.
Só que Karl Lagerfeld também foi uma figura polêmica, para dizer o mínimo. Hoje, a apenas alguns dias do Met Gala, momento em que as celebridades devem se vestir com looks que honram o estilista, vêm pipocando pela internet compilados com as frases infelizes ditas pelo estilista nos últimos anos de vida e vídeos de pessoas convocando todos a "boicotar" o Met Gala.
Lagerfeld adorava dizer que o processo criativo não é algo democrático, tinha várias falas gordofóbicas, antissemitas, contra imigrantes e capazes de violar uma série de direitos humanos num único golpe. Sinceramente? Algo quase que esperado de um homem branco cis que nasceu na Alemanha dos anos 30, teve uma vida extremamente glamurosa e elitista, trabalhou num ramo como o da moda, e, nesse curso, zero intenção de formar alguma consciência de classe.
E acredito que exatamente por isso, a exposição do Met foca apenas na obra dele. O próprio estilista deixava escapar pouquíssima coisa que transparecesse sua humanidade: criou um uniforme preto e branco que virou sua armadura/marca registrada, tinha pouquíssimos amigos íntimos, deixou sua herança pra um gato e até sua mais recente biografia demonstra dificuldades em retratar aspectos pessoais.
É um tema controverso pra exposição? Totalmente. Mas o que eu penso sobre isso? Bom, como diria o Chris Rock, a indignação seletiva tá aí, e o fato é que a moda (apesar de demonstrar que vem mudando a passos lentíssimos) tradicionalmente trabalha na lógica capitalista e cria ambientes de exclusividade, mistérios e restrições.
O Met Gala acontece há anos e eu e você nunca fomos (nem seremos) convidados pra ver nada mais que as celebridades passando pelo tapete vermelho - talvez o momento Solange e Jay-Z no elevador tenha sido a maior demonstração de humanidade já vista por quem tá fora do evento. Marca de luxo alguma tem qualquer intenção de se tornar acessível ao público em geral. E 90% do que a gente vê por aí representando atitudes "verdes", "éticas" ou "inclusivas" nas empresas do segmento é puro golpe de marketing. Resumindo: pra mim boicotar o Met Gala por causa do Lagerfeld é o equivalente a brigar com seu avô bolsonarista no Facebook.
Dito isso, vou assistir e comentar. E quem quiser assistir também, vem conversar comigo ao vivo pelo Instagram no dia 01/05.