Estilo Possível #18: Khy, a marca de Kylie Jenner mal nasceu e foi acusada de cópia
A criatividade é uma pasta do Pinterest?
Essa semana foi anunciado o lançamento da Khy, marca de moda de Kylie Jenner, que chega com a proposta de vender "luxo acessível", com peças a menos de U$200. E, como tudo que diz respeito às Kardashians, a marca já chegou fazendo um barulhão, com direito à uma enorme reportagem de capa na Wall Street Journal Magazine condecorando Kylie como "inovadora do ano de 2023".
Fundada em parceria com os mesmos investidores da Skims e da Good American (marca de Khloé Kardashian), a Khy promete lançar colaborações com novos designers sendo o primeiro drop em parceria com a Namilia, marca que desfila na semana de moda de Berlim.
Só que, antes mesmo de começar a vender as peças, Kylie já foi acusada de copiar modelos da designer e stylist Betsy Johnson (não confundir com a veterana Betsey Johnson). A designer postou ontem uma série de stories no Instagram dizendo que há seis meses trocou e-mails com a equipe de Kylie mostrando conceitos relacionados à sua marca, Products, e dando a entender que o pessoal da Khy usou suas ideias sem dar crédito ou firmar algum contrato comercial.
Além de Betsy, um canal no Youtube fez comparações entre o lançamento de Kylie e a coleção que sua irmã Kourtney lançou em parceria com a Boohoo exatamente um ano atrás. Na época, Kourtney usou um trench coat de couro muito parecido com o que Kylie veste na foto de divulgação do lançamento da Khy.
Não acho que essas alegações ou comparações vão mudar alguma coisa no plano de negócios da Khy. Até porque essa não é a primeira nem será a última acusação de cópia em torno dos negócios das Kardashian.
Mas fiquei me perguntando: será que a gente já recebe tanta coisa que é mais do mesmo que já viciou o olhar e nem liga mais? Será que é só mudar o plano de marketing, a embalagem, que já entendemos como algo “novo"?
Há algumas news atrás, contei aqui que tinha começado um curso de História da Moda e recentemente a discussão em sala de aula foi toda em torno de um artigo chamado "A Invenção da Moda Brasileira", que questiona os caminhos do desenvolvimento do que chamamos "moda brasileira".
Talvez pareça nada a ver, mas vendo esse lançamento e até mesmo os lançamentos de outros ditos produtos culturais lançados recentemente, não paro de pensar no que se pode chamar de inovação em 2023.
Aqui a gente já falou de como as marcas parecem estar se repetindo, correndo atrás do famigerado quiet luxury. E, realmente, não dá pra esquecer que a moda existe numa intersecção entre a arte e o comércio. Mas nos tempo ultrarápidos em que a gente vive, me parece que o tal fator artístico vem ficando em segundo plano em detrimento do marketing - e isso não acontece só na moda, mas em todos os meios culturais (vide o caos que foi a música encomendada para a campanha recente da Bauducco).
Mas, pra não correr o risco de ser injusta com quem tá de fato trazendo novas perspectivas criativas e (porque não?) de mercado, eu continuo atrás de mais informações.
Em sua dissertação que fala sobre cópia na história da moda brasileira, Cristina Seixas usa a definição do dicionário Michaelis:
CÓPIA: (lat. Copia):[...](2) Imitação; transcrito, calco ou reprodução de uma obra original, tal como escrito ou impresso, gravura, pintura, estátua, vestido, móvel, filme cinematográfico, etc.; [...]. COPIAR: [...](2) Reproduzir (falando de uma obra de arte): Copiar um painel. Copiou de um tipo ideal essa bela imagem; (3) Fazer a sua obra a exemplo de; inspirar-se de: Copiava-lhe
O Walter Benjamin falava sobre essa tal reprodutibilidade técnica como um meio de democratizar o acesso à arte, ou seja, ele considerava que quanto mais reproduções fossem feitas, mais gente retira acesso à uma obra. Ainda nessa linha, lembrei que li um texto (acho que foi no livro do Lipovetsky) que dizia que quanto mais as técnicas de produção se desenvolvessem, mais democrática ficaria a moda. Mas isso, claro, a gente tá falando décadas atrás, numa era pré-redes sociais. Então, será que hoje é isso mesmo que a gente vive? Uma “democratização"?
Tenho minhas dúvidas se a criatividade, em todos os meios culturais, não tá virando um grande board do Pinterest, com direito a anúncios e tudo o mais. Daí a gente vai seguindo uma maré de colagens de ideias pré-prontas mesmo sem perceber. Por falar nisso, o livro do Rick Rubin (que li esses dias por indicação da Passa e da Lela Brandão) tem uma frase ótima pra gente não perder de vista:
“Embora não possamos mudar aquilo que percebemos, podemos mudar nossa capacidade de perceber.”
E eu espero que a gente perceba cada vez mais os verdadeiros movimentos que nos fazem pensar, agir, viver e criar.